Reportagem especial

As vivências, a gastronomia e os rituais de quem passará o Ano Novo no Canadá, na índia e na Coréia do Sul, mas com saudade de Santa Maria

Pâmela Rubin Matge


Há quem dispense as festas e encare a data como mais um dia qualquer. Outros, literalmente fazem a contagem regressiva para o aguardado brinde de Réveillon. O fato é que é pouco provável que o Ano Novo passe despercebido. Além de ser um feriado, a data movimenta a economia, o turismo e, para muita gente, renova a fé e a espiritualidade.

A comemoração ocidental tem origem em um decreto do líder romano Júlio César, que fixou o 1º de janeiro como o Dia do Ano Novo em 46 a.C. Até hoje, são muitas as superstições em torno desse dia, no intuito de atrair sorte e boas energias para o novo ciclo. Por aqui, no ocidente, as mais comuns são usar roupa branca, comer sete sementes de romã, comer lentilhas, pular sete ondas no mar, não comer aves que ciscam para trás, comer doze uvas e assim por diante.

Mas, em vários locais do mundo, a celebração de um novo ano pode ser em diferentes datas até mesmo dentro do mesmo país, acompanhado de rituais, gastronomia típica e as mais diferentes histórias de quem vive essas experiências. Essa reportagem traz três pessoas ligadas a Santa Maria que contam como um pouquinho sobre as celebrações da passagem de ano em Vancouver, no Canadá; em Seul, na Coréia do Sul; e em Panu, na Índia, além da saudade do Coração do Rio Grande e do significado do dia para cada uma delas.

 NO RÉVEILLON DE VIVIANE, É DO CLIMA E DO CALOR   (HUMANO) QUE ELA SENTE SAUDADE


A tórrida temperatura de Santa Maria pode até incomodar muita gente, mas acreditem, é do clima subtropical e do calor humano que a consultora de Marketing Viviane Rossetto Ramos, 34 anos, sente mais saudade. Há sete anos morando no Canadá, país de origem do marido, a saudosa santa-mariense que atualmente em Vancouver, conta que já enfrentou 20°C abaixo de zero em uma "virada de ano" em Toronto. Para ela, o Réveillon sempre foi especial, era uma espécie de preparativo para seu aniversário, comemorado em 13 de janeiro, quando ela celebra, de fato, um novo ano.  

  • Local - Vancouver - Canadá
  • Clima e temperatura - Frio, com possibilidade de neve e Ano Novo em pleno inverno
  • Gastronomia - Sem refeições ligadas a superstições ou específicas da data. Os restaurantes oferecem um cardápio especial com três pratos
  • Rituais - Tem fogos de artifício na beira-mar e festas para todos os gostos. O ritual mais interessante é a "polar bear swim" ou nado do urso polar, que acontece há mais de 50 anos. Os residentes de Vancouver vão para as praias no dia primeiro de janeiro para dar um mergulho, mesmo com a temperatura em torno ou abaixo dos zero graus. Muitas pessoas também gostam de iniciar o ano com uma trilha nas montanhas cobertas de neve.

O RELATO DE VIVIANE

"Se tem uma época do ano em que a saudade realmente bate é o período entre Natal e Réveillon. Como o outono por aqui começando no final de setembro, é um progresso devagar (e doloroso) chegar dos dias longos e ensolarados até os dias mais curtos do ano como foi neste dia 22 de dezembro no solstício de inverno. Nesses dias curtos, se tivemos sorte de ver o sol, certamente nunca será depois das 15h45min. Às 16h, está completamente escuro. Com isso em mente, fica fácil entender porque a saudade bate forte durante as festas de final de ano. O clima em bares e restaurantes é superfestivo, mas é bastante improvável que você veja alguém vestido de branco como é normal no Réveillon brasileiro. As festas acabam cedo por conta das leis locais. Os bares que ficam abertos até mais tarde fecham às 2h. Além do frio, o principal obstáculo da noite de Ano Novo e a falta de táxis na cidade (Uber foi vetado pelo sindicato dos taxistas), então, é normal você ficar na rua em torno de uma hora tentando achar um. Em uma noite de Réveillon que passei aqui, um homem parou na frente do restaurante onde eu estava com meu marido e um grupo de amigos e ofereceu para nos levar em casa, o que aceitamos na hora. No caminho, enquanto conversávamos, ele nos contou que aquilo tinha se tornado seu ritual anual: sair à meia- noite, dando carona para estranhos a noite inteira sem pedir nada em retorno para atrair um karma positivo no Ano Novo".

PARA THAÍS, A COMEMORAÇÃO É DUPLA: MAIS UM ANO E UMA SEGUNDA CASA


Ela está há dois anos no país asiático e trocou os costumes do Rio Grande do Sul, um dos esportes favoritos que praticava em Santa Maria e deixou para trás amigos "falando a mesma língua". Ainda que cada dia seja um novo desafio em Seul, na Coréia do Sul, Thaís Cureau, 23 anos, encontrou em meio a diversidade coreana um novo lar. Atualmente, cursa Relações Internacionais e Administração Universidade Hankuk de Estudos Estrangeiros, dá aula de português para adultos e crianças coreanas (tutoring) e faz trabalhos de modelo. Em cerca de dois meses, terá o prazer de celebrar dois Anos Novos: o de 31 de dezembro, comemorado no Brasil, mas que passará em solo asiático, e o de 5 de fevereiro, dia da passagem de ano na Coréia do Sul.

  • Local - Seul _ Coréia do Sul
  • Clima e temperatura - Ano Novo no Inverno, com temperaturas negativas
  • Gastronomia - No Ano Novo da Coréia é tradicional servir tteokguk, uma espécie de sopa e o Galbijjim, que são costelas pequenas, além de acompanhamentos como o Kimchi, um repolho com pimenta, que está sempre presente. A comida coreana, em geral, é muito apimentada
  • Rituais - Eles vestem-se com a roupa tradicional, o Hanbok, que tem cores vibrantes por acreditarem que atrai coisas boas no novo ano. Normalmente a celebração dura três dias e não há grandes festas, pois se reúnem com a família, fazem pedidos para o novo ano e trocam presentes. Os mais velhos costumam dar dinheiro aos mais novos, além de um "dinheiro de brinquedo" colocado em sacos da sorte feitos de seda. Já as crianças, desejam aos anciões o Sebae, uma reverência em que ajoelham-se repetindo as palavras "saehae bok mani badeuseyo" que significa por favor, recebam muita sorte no Ano Novo

O RELATO DE THAÍS

"Moro há dois anos e Seul é totalmente diferente de todas cidades que já fui na vida, principalmente a segurança e educação. É absurdo, outra cultura que é a minha virada ao avesso, uma língua que eu quebro a cabeça diariamente para entender. Porém, é também minha casa, pois é aqui que eu consigo ser eu mesma sem me preocupar com o que os outros vão pensar, sem me preocupar se estão me cuidando, se vão fazer algo comigo. Morar aqui é e sempre foi uma sensação de liberdade tremenda. Sinto saudade da cultura, do idioma, da família. Passar o Ano Novo longe deles é difícil. Tenho muita saudade da relação com as pessoas e da época de Santa Maria, principalmente, do vôlei. Recentemente fiz até um vídeo para Associação Vôlei Futuro (AVF). Aqui eu não jogo e tenho lembranças de uma equipe muito acolhedora, época em que fui muito feliz. Na Coréia, eles não é seguido o calendário do ocidente e, sim, o calendário lunar, igual o dos chineses e cai no dia da segunda lua nova, depois do solstício de inverno. O próximo Seollal, que como chamam o Ano Novo, será no dia 5 de fevereiro e normalmente a comemoração dura três dias. Tenho para mim, que os planos têm de ser traçados a curto prazo, para não perder a força. E um ano é um bom período para isso. Entendo Ano Novo como renovação. Mas, para esse dia 31 de dezembro, não estou criando muitas expectativas e só vou juntar meus amigos para fazer alguma coisa, pois a maioria das minhas amizades são estrangeiras." 

"CADA DIA É UM NOVO CICLO, UMA NOVA OPORTUNIDADE", DIZ TADANY


Executivo internacional, cidadão global, palestrante, poeta, escritor, pensador, espiritualizado, dinâmico, agradecido e aventureiro". A autodescrição, bem como o currículo de Tadany Cargnin dos Santos, 43 anos, são extensos. Pudera com vivências em diversos países e, nos últimos anos, no mais populoso do mundo: a excêntrica e milenar Índia. Especificamente, na cidade de Pune, no Estado de Maharashtra. Em Santa Maria, Tadany era membro da Aiesec e foi para o Exterior logo que terminou a faculdade. Formado em Administração pela Universidade Federal de Santa Maria (UFSM). No final de 1999, ele chegou a Finlândia, para um estágio na ABB, uma das maiores empresas mundiais em equipamentos para usinas elétricas. Em 2003, foi contratado por uma estatal francesa para comandar projetos de geração de energia no México e, atualmente, é executivo da multinacional IBM. Embora vida profissional pulsante, foi na espiritualidade que emana da Índia que Tadany encontrou maior equilíbrio para sua vida.

  •  Local - Pune - Índia
  • Clima e temperatura - Ano Novo no inverno, temperratura em torno de 20C
  • Gastronomia - Um doce sempre presente é o Puranpoli, feito com farinha de lentilha e adoçado com açúcar mascavo. Outra comida típica do Ano Novo é o sabudana Vada, um bolinho frito feito de tapioca, amendoim e batata amassada
  • Rituais - Em Maharashtra, o Ano Novo é celebrado em abril, no fim de uma colheita e o início de outra. O Gudhi Padwa, como é chamado, marca o novo ano hindu. Já o Diwali é uma festa religiosa para o hinduísmo em diversos locais do país, também conhecida como o festival das luzes em que as pessoas usam roupas novas e lançam fogos de artifício. Muitos colocam luzes fora das casas para simbolizar a luz interior e para proteger-se da escuridão espiritual 

O RELATO DE TADANY

"A Índia é um país indescritível e não classificável. São 14 idiomas oficiais, cada um com um alfabeto. Aqui encontrei todas minhas respostas existenciais. O Ano Novo depende do lugar do país. Não há uma uniformidade como no Ocidente. Por exemplo, vivo em um Estado chamado em Maharashtra, em que o Ano Novo é celebrado em abril, que é o primeiro signo do zodíaco. Já morei no Sul da Índia em um outro Estado em que é o novo ano é na primeira lua cheia do mês de janeiro. E tem vários outros locais e outras datas, mas nenhum deles é no dia 1º de janeiro. Tem uma celebração anual que é considerada por todos é o Diwali, entre outubro e novembro. Mas, aqui, tudo segue o calendário lunar e solar ou zodiacal. No dia 1º de janeiro será um dia normal para nós. E eu vivo um dia de cada vez. Cada dia é um ciclo que reinicia, um Ano Novo", uma nova oportunidade."

REPORTAGEM - Pâmela Rubin Matge
FOTOS - Arquivo pessoal

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